Inicio este texto pedindo a quem for lê-lo que se dispa de quaisquer rancores acerca do episódio "William Waack". Ele errou, sim. Mas será que isso o torna uma pessoa racista?
Antes de mais nada, recomendo que assistam a entrevista dele, concedida à Veja, no dia 15/01/2018.
Pois bem, foi uma entrevista de repercussão macro, se assim posso dizer, tendo em vista que todos os que o criticaram pelo infeliz episódio (o qual ele mesmo se arrepende profundamente, explicando que não era a intenção ser racista), sequer imaginaram que poderiam - e provavelmente já cometeram - o mesmo erro que ele: fazer uma piada racista, sem ao menos imaginar que a fez.
Calma, não estou defendendo o racismo. Sou totalmente contra qualquer ato neste sentido. Sou contra a infeliz piada proferida pelo repórter William Waack, todavia não sou contra perdoa-lo por ter cometido um vacilo - até porque ele mesmo pede perdão por ter feito tal piada.
Ocorre que, geralmente quando as pessoas cometem tal racismo (e imagino que praticamente em 99% das vezes, sequer devem imaginar que o estão cometendo), não são julgadas pela grande parte da sociedade - pelo contrário, devem arrancar risos dos seletos amigos/colegas que presenciam a piada com um "racismo não intencionado".
Termo interessante este: "racismo não intencionado". Ora, não somos nós educados desde pequenos que o normal é ser branco, enquanto o oposto à normalidade é ser negro, índio, asiático, mulato, etc, e, assim, aderir ao "diferente" a carga de sua "raça"?
O racismo nasce a partir do momento em que você o reconhece!
Este posicionamento está bem mais claro na entrevista que a pesquisadora Lia Vainer Schucman concedeu ao The Intercept Brasi: “VER O RACISMO COMO UM ‘PROBLEMA DOS NEGROS’ É UM PRIVILÉGIO DOS BRANCOS”, como se observa no trecho abaixo:
A raça é um conceito construído no século 19 por uma pseudociência que vai dizer que um determinado fenótipo vai ter uma continuidade moral, intelectual, estética. Falar em identidade racial branca é falar que há significados histórico-culturais construídos sobre o fenótipo branco – fenótipo que terá atribuições morais, intelectuais e estéticas que trazem uma ideia de civilização por trás. Esse conceito de raça foi construído com uma ideia fictícia de superioridade: o próprio grupo que inventou o conceito (brancos europeus) hierarquizou e disse que algumas atribuições eram melhores do que outras. Então, os brancos se colocaram em uma posição de superioridade em relação a outros grupos.Ruth Frankenberg, teórica britânica do tema, diz que a branquitude que é um “lugar confortável, onde você olha os outros através da lente que você não olha a si mesmo”, e esta lente é a raça. Olham-se os negros como um grupo racializado, os indígenas como grupo racializado, mas os brancos como indivíduos. A branquitude é uma racialidade que se compõe desta noção de raça construída no século XIX, mas que não é vista enquanto tal: é vista como neutra. E, além de neutra, ela blinda aos brancos a ideia do que é negativo. Mesmo que os brancos europeus tenham feito a escravização de negros e indígenas, o genocídio dos judeus, a colonização da África e do Oriente, eles aparecem no imaginário como continente civilizatório, enquanto a África aparece como o continente da “barbárie”.
E vai uma experiência vivida por mim, acerca deste tema racista:
Estava eu, branco, trajado de social, no Juizado Especial da comarca de Betim/MG, no setor de distribuição. Percebi, de relance, uma pessoa ser atendida, provavelmente postulando alguma demanda.
Ocorre que, esta pessoa era um mulher, negra, trajando vestimentas simples e, dentro da bolsa que portava, percebi três malabares: concluindo, de cara julguei ser uma moradora de rua. Juro, foi de forma inconsciente! Meu cérebro, automaticamente, direcionou meu raciocínio para este lado.
No mesmo instante, eu me policiei: desferi-me um tapa-na-cara-psicológico, repreendi meu raciocínio automático, e me retirei o direito de pré-julgar aquela pessoa que estava ali, que eu sequer conhecia, não sabia de onde vinha e nem pra onde ia.
Desde então, e com mais afinco, venho me policiando acerca destas trapaças que a mente causa. Ser racista, muitas vezes, não é um ato racional. Como a própria pesquisadora supracitada diz, em outras palavras, somos diariamente educados, desde pequenos, a ser, de forma velada, racistas, quando reconhecemos que a "branquidade" é o padrão a ser seguido.
Pois bem, voltando ao raciocínio da intolerância, espero ter sido claro: não defendo piadas racistas, isso jamais. Mas devemos exercitar a mente a não ser racista. É importante exercitar a empatia, de se colocar no lugar do outro. De reconhecer que qualquer um pode cometer um erro, assim como o William Waack cometei e, de forma bastante interessante, pediu desculpa.
A aversão aqui postulada é a de utilizar dos argumentos "racismo", "camisa do time", "posicionamento político ou religioso", etc, para impor uma moral/vontade subjetiva - e quando falo de "moral/vontade subjetiva", digo "moral" e "vontade" misturadas, inerentes ao sujeito, inerentes à vontade deste, de sobrepor seu posicionamento ao posicionamento alheio, como se fosse a única pessoa certa no universo.
No mais, espero que esta fase precoce (muitas vezes imatura, na qual a liberdade de expressão, os direitos individuais, estão sendo suprimidos, devido ao alto nível de intolerância, em praticamente todas as esferas sociais) passe, e que as pessoas pratiquem mais a empatia, entendendo que podem cometer o mesmo erro outrora julgado prematuramente.
Att. Emanuel Bessa
Att. Emanuel Bessa
Nenhum comentário:
Postar um comentário